A minha Banda

    Foi há praticamente uma década que entrei pela primeira vez na banda filarmónica da minha terra. Naquela altura tudo era assustador, não conhecia nada, nem ninguém... Lembro-me desse dia como se fosse hoje, os meus pais achavam impensável tocar numa banda filarmónica à dois anos e não ser a da nossa terra natal, então após o meu sinal favorável, lá me levaram eles até um edifício um pouco velho, mas bem conservado, era escuro e vazio logo à entrada, mas à medida que íamos subindo a luz ia aparecendo. Lá ao fundo já se conseguia ouvir uma espécie de melodia um pouco atrapalhada de alguém que estudava com afinco aquela passagem complicada da obra musical. Após vários lances de escadas, cheguei a uma porta creme, com um letreiro por cima onde se podia ler: "Direcção". Os meus pais entraram nessa sala afim de perguntar quais as possibilidades da minha entrada para aquela banda filarmónica, o Presidente, que estava sentado numa grande secretária, esboçou um sorriso de orelha a orelha e olhando para mim disse: "Pode começar já hoje", mas eu não queria começar já, então apenas fui ver como funcionava o ensaio, ensaio esse que estava cheio de gente desconhecida e tinha um senhor de cabelo branco muito sorridente, ao qual todos chamavam "Mestre". Não quis participar nesse ensaio, mas ficou a promessa que começaria na semana seguinte, e lá fui eu... Quando, uma semana depois, entrei na sede da banda, esta já não me parecia tão escura e fria, embora o meu coração batesse cada vez com mais velocidade, as escadas foram mais fáceis de subir. Mesmo no último andar da sede estava o maestro à porta da sala de ensaio aguardando a minha chegada, que já havido sido divulgada por todos aqueles que me tinham avistado nas escadas, o maestro apressou-se a convidar a entrar na sala, onde eu já havia estado na semana anterior, informando-me do meu lugar na disposição das cadeiras da banda filarmónica. 
    Ensaios para cá, serviços para lá, actuações aqui, espectáculos ali.. e assim se passou praticamente uma década desde que entrei pela primeira vez na sede da banda filarmónica da minha terra.
    Há cerca de 5 anos foi me feito um convite muito importante, leccionar aulas na Escola de Música desta banda, que havia sido estruturada a nível de pessoal docente à pouco tempo... Mas dar aulas eu? Eu nem sabia ser professora. Muito hesitante sem saber bem se aceitaria ou não, e passado algum tempo respondi afirmativamente... começou assim a maior aventura que poderia ter nesta instituição e na minha vida.
    Comecei por ser ajudante do Professor para ver como funcionavam as coisas, passei depois a dar aulas a crianças a partir dos seis anos de idade, sem limite máximo, pois todos têm o direito de aprender esta tão bela arte. Recentemente criei aulas de música para bebés com idades compreendidas entre 1 e 3 anos e para crianças onde as idades abrangem entre os 4 e os 6 anos. Foi aqui que nasceu a minha maior paixão.. ser professora de música.
   É um privilégio poder tocar junto de quem já ensinei, mas sobretudo é um orgulho partilhar o meu conhecimento e experiência musical com crianças, jovens e adultos que têm pela música a mesma paixão que eu tenho. É também uma honra contribuir para o enriquecimento musical da banda filarmónica da minha terra. Enche-me de alegria passar pela rua e os meus alunos (que estão a aprender) e os meus colegas (que já tocam na banda comigo) cumprimentarem me de forma tão calorosa. Sabe bem sentir o carinho que recebo em retorno a todo aquele que diariamente deposito naquela sede.
    Hoje em dia, trato esta sede, como um lugar especial para mim, a minha segunda casa, é lá que passo a maior parte do meu tempo livre.. As paredes e salas escuras, as intermináveis escadas, transformaram-se agora em alegria, há mais cor do que havia há dez anos atrás, há mais objectivos e sobretudo há mais amor e dedicação, a esta banda que sempre terá um lugar especial no meu coração.
    É um orgulho relembrar estas memórias da minha banda... da minha Sociedade Filarmónica União Calipolense.

Professora de Música

    "Se fosse ensinar a uma criança a beleza da música não começaria com partituras, notas e pautas. Ouviríamos juntos as melodias mais gostosas e lhe contaria sobre os instrumentos que fazem parte a música. Aí, encantada com a beleza da música, ela mesmo me pediria que lhe ensinasse o mistério daquelas bolinhas pretas escritas sobre cinco linhas . Porque as bolinhas pretas e as cinco linhas são apenas ferramentas para a produção da beleza musical. A experiência da beleza tem de vir antes." (Rubem Alves)
    Hoje sim, sou professora de Música... Ui que aventura esta que abracei com todo o carinho e à qual me dedico todos os dias.
    As aulas começam, ainda em casa, quando estão a ser preparadas, surge ai o inicio da viagem a que muitos chamam aulas. Por altos e baixos lá nasce o prototipo da aula desse dia, e lá vou eu para a escola. Assim que lá chego já levo comigo a felicidade de fazer aquilo que mais gosto esboçando um sorriso natural. Passo pelo corredor e oiço vozinhas, vindas muitas vezes sei lá de onde, que dizem: "A  Professora de Música chegou", "Olha a professora, será que é o nosso dia de ter aula de música" e as vezes uma voz mais atrevida rompe a minha concentração (na aula que irei dar) e ouve-se cada vez mais perto: "Professoooraaaaa quero um beijinho" e lá dou eu um beijinho enquanto trocamos umas palavras carinhosas entre nós (professora-aluno) ou até mesmo entre os pais.
    Bem lá continuo eu o meu caminho até à sala de aula, quando lá chego ela está escura, fria e sem vida, então é preciso dar-lhe cor, deixar entrar a luz do dia (ou às vezes a luz artificial), e enche-la de  vida e de alegria.
    Preparam-se os últimos pormenores até à chegada dos alunos, ligam-se dispositivos multimédia, arranjam-se os instrumentos e... E bora lá buscar os meninos e meninas às respectivas salas, onde esperam ansiosos pela minha chegada, já todos em comboio, comboio esse que não se desfaz, só aumenta com a entrada progressiva das crianças.
    Eis que chagámos à nossa Sala de Aula, já toda ela enfeitada e pronta a rigor para o tema da aula preparado. Enquanto os alunos se acomodam de forma agitada esperando ansiosos pelo tema da aula, o meu coração (de forma espontânea) parece não querer mais estar naquela situação e começa a bater de forma apresada, ligam-se umas luzes de alerta dentro do meu cérebro avisando de que existem perigos eminentes e que por vezes as coisas podem não correr como planeado. Tento sossegar todo o meu interior (o que nem sempre é fácil) pensando que está tudo tão preparado que nada poderá correr mal... E lá vamos nós...
    A aula começou, as crianças correspondem ao que lhes estou a pedir... é cada vez mais fácil envolver-me no ambiente, muitas vezes criado por elas... E a matéria é dada de forma lúdica e divertida e de repente lá passou o pouco tempo que temos para estar juntos. Vamos formar o comboio novamente, entregar as crianças nas salas onde as fui buscar e muitas vezes aos pais que já aguardam a nossa chegada. Agora é só dar os beijos de despedida a todos aqueles que correm na minha direcção e voltar à sala, arrumar todo o material, fechar as luzes e deixar a promessa que amanhã regressaremos (eu e os alunos) para mais uma viagem nestas maravilhosas aulas.
   Todo o meu interior foi invadido pela felicidade de dever cumprindo, porque quando gostamos daquilo que fazemos todos os contratempos se tornam ferramentas de trabalho, e trabalhar com crianças esta arte tão fascinante da música é algo inexplicável, é algo maravilhoso.

Pela minha família… Onde o amor cura

Hoje estou a escrever na sala, sozinha porque cada um dos meus amores está nos seus “trabalhos”. Estive mesmo lá em baixo e durante muito te...